sexta-feira, 27 de abril de 2007

Mulheres.

São fadas, são bruxas

São a redenção dos pecadores, a tentação das pecadoras

São o segredo de nós todos

São jardins de lírios irrigados com doses de saliva profana de beijos dissimulados

São a pureza mergulhada no pecado

São tudo o que não se pode explicar, e se não se pode explicar, vibra misterioso, e o misterioso nada mais é do que incógnita perfeita

São as musas das telas emolduradas por dós, rés, mis e fás

São a bula de letras miúdas, perdidas e infinitas

São morenas cor de tempestade

São pálidas, cor de saudade

São múltiplas, cor de aquarela, de Tarsila, ou de algodão-doce

São o pó mágico de Deus que faz tudo ficar belo

São o fundamento, são a lei

São o avesso de suas reviravoltas, das minhas

São o doce sabor ajaboticabado de uma fruta que esperou o outono partir para cair

São harpas elétricas

São a primeira gota de água bebida

São a fantasia do carnaval, a máscara invisível da nitidez

São Clarices, Olgas, Carlas, Ednas e Marias

São o atalho por um bosque cheio de magia e portas secretas

São lábios envoltos por um feitiço tropical de danças e redemoinhos

São mãos carregadas de flores, sensíveis, mudas e venenosas

São o inalcançável

São o indecifrável

São eu.

Sou eu.

terça-feira, 17 de abril de 2007

Cena (não)descrita

Seu passo apressado me deixava confusa. Me deixava pensativa, a olhar sempre para o horizonte, vendo sua figura sumir aos poucos. Seus trejeitos remetiam a uma caricatura, tão expansivos que eram. Seu olhar era incerto, ambíguo, me deixava verdadeiramente embaraçada. Era uma figura escorregadia, de fato.
Sua postura me era familiar, seus passos, seus gestos eram todos por mim conhecidos. Sua maneira própria de segurar a caneta e de escrever com a canhota, seus olhares soslaios e sinuosos, sua obliqüidade peculiar...
Sua aparência ofegante, cansada, necessitada de afago. Seus gestos amáveis, nobres, outros nem tanto. Sua vaidade quase despercebida, seu orgulho sutilmente ferido. Suas concepções transformadas e temerosas. Seu medo inimigo. Meu medo amigo.
Suas unhas roídas por vício assemelhavam-se às minhas, roídas por ansiedade. Suas mãos estavam pegadas às minhas, ligadas por algo que eu não saberia explicar, contínuas, coladas pelo suor que emanava da minha pele. Ininterruptas, como um só corpo.
Seu espírito livre, seu pensamento preso, atado a mim. Sua existência. Minha existência.

domingo, 15 de abril de 2007

O espetáculo.

A primeira luz. A segunda, a terceira, várias, indecisas... Acesas, pareciam peças de um colorido impiedoso. Abriram-se as cortinas, inflamáveis, lascivamente cegas, rubras de pecado e de vergonha. Em meio a sua delicadeza disforme de bailarina, nasceu um rosto cínico, pintado de cores indefiníveis e irrefutáveis. Carnavalescas, fúnebres, pálidas. Parecia uma arte sem rascunho, sem ensaio, somente um escândalo inacessível de suas vontades tímidas. Sua coreografia ritmava meus gritos, dispunham-no numa seqüência tão constante, quanto bela, tão pálida, quanto breve. Vestiu a poesia da fêmea de mim, calçou versos cor de letargia. Respirava meu sufoco impróprio. Era a perfeita escultura da mentira condenada. Era a linda estrofe de meu colo ansioso. Seu tango solitário recitava faces de dúvidas irremediáveis, confundindo-me, aos poucos, com o meu medo de não me ser. Seus passos trôpegos dançavam minha dança épica. Seus olhos calados sorriam minha boca muda. Seus olhos calados sorriam. Minha boca, muda.

quarta-feira, 11 de abril de 2007

Ela.

No início, suas sobrancelhas arqueadas me amedrontavam, pareciam peças malévolas, criadas para repelir qualquer aproximação, ou para sugar energias, não sei. Traços densos. Davam-me arrepios. Seus dedos delgados ainda não sugavam meu universo a seus pequenos detalhes. Era a atriz principal de um palco em que as cortinas ainda se mantinham fechadas. Mas passa-se o tempo. E com ele ascendeu um par de... Como é mesmo o nome? Sim! Olhos, um par de olhos... Quanta ternura numa só cor, num só verde. Espessos, perdidos em segredos, um conjunto de atropelos, súbitos e constantes, sempre firmes, quase inacessíveis, todavia vulneráveis. E esse casal fundiu-se ao sorriso, convite dos lábios a uma hora de prosa, a uma vida de poesia. Mesclou-se ao desejo, inquietação da alma, subversão do corpo. Roubou-me o equilíbrio e os holofotes. Fez dos devaneios, desejos intensos de realidade. E agora, as sobrancelhas irascíveis não mais assustam, não passam de uma moldura, de um intensificador substancialmente frágil, idílico e arrebatador de nós mesmos.

domingo, 8 de abril de 2007

E que haja a luz

E é como se tudo se desfizesse rapidamente. Um clarão de luz te absorve completamente e você cambaleia por instantes. Oscila pra cá, mais do que pra lá. É uma cegueira temporária.
Com a mesma rapidez e intensidade que vieram as coisas, vão embora. Essa é a lei natural que tudo move...
É tudo muito relativo, e até o muito relativo é absoluto.
Completamente sem inspiração...

quarta-feira, 4 de abril de 2007

A cadeia e os princípios ativos

Por que só pensamos em dar “aquela” resposta após ter passado a oportunidade? Talvez porque o momento não merecesse a nossa resposta, e talvez o futuro não seria se sua fala fosse proferida. Mas esta não seria, esteja certo.
Por que só encontramos quando desistimos de procurar? Um brinco, um livro, um amor...
O brinco e o livro podem ser os princípios de uma cadeia de acontecimentos. Perde-se o brinco, substitui-o, chama atenção por algo específico que “os perdidos” não tinham e daí pode-se imaginar diversas continuações, apesar de, somente uma, ser “concretamente” válida. Perde-se o livro, perde-se a aula, sai da classe, passa por um desconhecido que te pede as horas e, quem sabe, depois de uns dias, ganha seu tempo. Quanto ao amor, porque talvez não tenha passado por antecessores momentos suficientes para te tornarem “merecedor (a)” de um bem específico.
São fatos simples, todavia não isolados.
O que teorizo agora (que, para muitos, será apenas mais uma loucura de homens loucos) pode ser o “princípio ativo” de uma série de acontecimentos, os quais podem implicar a mim, a você, ou a qualquer outro (a) que adentrar a astúcia do nosso pensamento, o pensamento humano.
A “cadeia” acontece todo o tempo, em torno dos milionésimos de segundo. A cadeia é uma “máquina de princípios ativos” com os quais nos deparamos sem saber. Uma chuva que te faz proteger-se em certo lugar, um desentendimento que te faz mudar os planos de uma noite, uma música, um filme, um livro...
Há, ainda, duas coisas importantes a se ressaltar.
Primeiro: a conseqüência dos “princípios ativos” pode ser extremamente imediata, mas também podem ativar uma seqüência longa de fatos que só culminará no objetivo após um longo tempo (dias, meses, anos...), dependendo, inclusive, de “princípios” de outrem, que se intercalam, mesmo que para fins diferentes.
Segundo: sabendo-se que há um “objetivo” indispensável e certo, não se pode recorrer à inércia proposital, pois negligenciaria sua participação na cadeia que, por sua vez, só existe enquanto você vive em função de seus objetivos, mesmo que estes não sejam “reais”, ou seja, conseqüência independente das “ativações”. O ócio invalidaria a seqüência de acontecimentos.


Não aprendi, ainda, a concluir teorias, contudo creio que a melhor conclusão fica a critério das mentes que a terão a seus alcances.

Dias 13.02.07

A fruta proibida

O que seria dos nossos imaginosos corações se não criassemos universos paralelos? Aproveitando realidades inventadas, situações particulares e inesperadas(no mundo real, é claro), saboreando cada momento verdadeiramente especial, momentos que nunca aconteceram de fato... Fechando os olhos e sentindo o que é realmente de desejo seu. Percebendo instantes de excitação. Tocando faces com simples movimentos no ar. Contando fábulas para si mesma, aponderando-se astuciosamente do outro. Desejando pêras.
A espera tem um doce sabor amargo. Paciência. Por que será? A espera pelo dia de chegada no plano real da compra da maravilhosa pêra será diretamente proporcional à percepção que se terá da importância e singularidade daquele momento, quando ele estiver chegado. Enquanto isso, imagino ela me esperando numa vitrine, entregando-se aos poucos, até o instante em que terei dinheiro suficiente para comprá-la. As saliências que a fruta apresenta me enchem a boca de água.
Uma vez ou outra, fico a espreitá-la atentamente. Observo com grande minúcia, reparo nas suas curvas, nos seus tons e sinto aquele suave cheiro de longe. Quando menos espero, sou surpreendida por alguém a me ver babar pela fruta. Conto-lhe então, com um certo acanhamento e um rubor desconcertante nas maçãs do rosto, o quão grande é meu apetite e verdadeira a minha intenção em possui-la. À medida que vêm e vão as Luas, sinto que a pêra torna-se ainda mais suculenta. E, como consequência, torna-se ainda mais proibida também. Receio que nem Adão e Eva, criados diretamente a partir de uma atitude divina, conseguiriam resistir a essa tentação.

terça-feira, 3 de abril de 2007

De olhos fechados.

Ontem fechei os olhos. Transfigurei meu mundo, criei vários planos. Ciclos em ciclos. Sempre doces mundos, sempre certos ciclos. Fugi para o futuro, ou melhor, ele me seduziu. Imaginei-me cinco horas, dez dias, vinte anos na frente. Meus desejos inconfundíveis tomaram liberdade de criar suas próprias trilhas sonoras. Criei paisagens, fundos do meu protagonismo indecente, do meu livre egoísmo. Senti o alívio de roubar o sol para o meu “pôr” e beijar os lábios melífluos de uma garota que derramava seu amor por mim. Em suspiros, em planos, em espelhos. Vi amigos numa gargalhada escandalosa, contínua e paralela, alguém deve ter contado uma piada, não me lembro bem. Criei padrões impossíveis, daqueles que só os devaneios explicam. Desenhei-me com gosto de todos os paladares. Coloquei a lua na minha janela, a meia-luz no meu ritmo e o eco nas minhas palavras. Mas foi ficando fácil, muito fácil e não controlei.

Passou. Agora já estão abertos.

segunda-feira, 2 de abril de 2007

Nota sem nome.

Quero-me “abobalhar” nas fantasias
Quero ouvir notas que formem um só nome
Quero sentir aquela aflição que distrai, sentir o que não mais sei sentir
Quero lembrar o que é amor
Quero me livrar da secura, das desconfianças e critérios inúteis
Quero me largar, despejar-me ao alcance de fadas e duendes coloridos
Quero lembrar o que é isso, suspirar de amor, ser patético, cantar pieguices
Quem o tem é feliz, garanto
Quero sofrer com a dor de não ser correspondido
Quero ter alguém para lembrar quando ouvir aquela musica, ou assistir àquele filme
Como é mesmo que se faz?
Quero alguém pra me dizer que é pra sempre, mesmo sabendo que não será
Não sei mais sentir, não sei mais sentir...
Quero sentir a costura das mãos, dedo por dedo, um acúmulo simples e perfeito de ternura
Quero amar além do medo
Quero sentir-me vivo
Como é mesmo que se faz?
Não sei mais sentir

domingo, 1 de abril de 2007

Monólogo

Às vezes nos sentimos como seres incompletos, estranhos no ninho, à procura de algo maior, mais intenso, arrebatador. Somos vítimas de uma fadiga, uma canseira, uma inércia, um tédio, uma monotonia, uma ânsia por algo que não existe, uma saudade de algo que nunca aconteceu, ou pelo menos algo que já aconteceu mas que ainda não veio à tona... Se é que vocês me entendem!
A natureza homogênea das coisas me faz pensar... Apenas pensar. Essa similaridade traz sentimentos nada otimistas. É angustiante imaginar a maneira como tudo é tão igual, uniforme. Tormento! O vazio me preenche... De uma forma inimaginável! Sentimentos no vácuo.
Há uma constante falta de sentido. Nada de gradação de cores, matizes, apenas tonalidades opacas... Uma insipidez (in)suportável.
Essa nostalgia amiga faz com que eu me olhe no espelho e veja outros olhos em um velho rosto conhecido. Olhos de uma outra época, distante...
Necessita-se de uma injeção de ânimo.
Desfalecendo estou...